Escrever sobre Eusébio já é difícil. Foi um genial jogador e uma pessoa
íntegra, humilde e genuína. Escrever sobre o “Pantera Negra” no dia em
que partiu é tão complicado como ingrato. É que Eusébio é vida, não é
morte. Eusébio é garra, é vitalidade, é força, é toque mágico. Nada em
Eusébio combina com o sentimento de tristeza e pesar que invade este
país que ama o futebol. Eusébio chorou por nós no Mundial de 1966, ele
amava Portugal, ele sentia o nosso país, quis levar a nossa bandeira tão
longe quanto possível. As lágrimas dele naquele dia não deviam ser as
nossas hoje. Repito: não deviam ser as nossas hoje porque devemos
celebrar tudo o que nos deu. Mas nós, ao contrário de Eusébio, somos
mortais, choramos a partida dos nossos ídolos, sentimos que mais uma
referência desaparece deste Mundo que nos dizem que é apenas uma
passagem. De uma coisa estou certo: o King tem lugar onde só os melhores
chegam. Uma espécie de paraíso dos geniais, das figuras que lembramos a
sorrir, que recordamos pelas melhores razões, numa memória colectiva
que jamais se apagará.
Com Eusébio percebi que o futebol é mais do que um toque fantástico
numa bola (que até começou por ser de trapos, no seu caso). Ser
futebolista (como desportista em geral) é ter noção de que há um adepto,
de que há um valor que mais alto se levanta, há um clube, há um país.
Eusébio seguiu a máxima de Mário Wilson que um dia, numa gala de um
qualquer aniversário do Sport Lisboa e Benfica, disse que, quando
jogava, um valor mais alto se levantava. Esse valor chamava-se Benfica.
Eusébio desde cedo percebeu isso e foi enorme. Enorme como poucos serão.
Enorme na humildade, na sinceridade, na genuinidade, no respeito pelos
companheiros de equipa com mais idade e experiência, e no respeito cheio
de rivalidade para com os seus adversários que hoje também o choram. E
sem nunca esquecer o adepto, o benfiquista e o português. Ele jogou por
todos nós.
Eusébio
viveu num tempo difícil, num Portugal cinzento, cheio de incertezas.
Ele foi a imagem de um país. Com a “Gaivota” da Amália Rodrigues voou
por esses relvados fora sabendo de antemão que o regime queria que fosse
a nossa bandeira tentando mostrar que havia um bom ambiente colonial.
Eusébio foi também usado politicamente como tantos e tantos outros,
Amália, por exemplo. E como gostavam um do outro. Sem rivalidades. Um
fintando adversários criando oportunidades de golo onde muitos nem
sequer sonhavam que a bola passasse, rematando brilhantemente provocando
reacções de espanto nos guarda-redes que nem sabiam por onde a bola
tinha entrado. E outro, neste caso outra, cantando e encantando com a
ajuda de grandes letras, de grandes composições e de uma voz ainda hoje
considerada como uma das melhores vozes do século XX. Eusébio e Amália,
duas lendas que se tivessem nascido noutro país, mais aberto ao mundo,
eram ainda hoje mais glorificados, mais homenageados, mais profundamente
admirados. Têm a admiração deste povo que “Lava no Rio“ e que como
dizia Manuel Alegre viu os golos de um senhor que escrevia poesia nos
relvados. Hoje, se o mundo dos imortais for como eu sonho estarão juntos
a contar histórias e a encantar outros tantos que também merecem lugar
cativo nesse espaço belo que a imaginação consegue idealizar. Eusébio
vai estar sempre connosco. Ele não é Benfica, é Portugal. Ele não é só
jogador, foi um brilhante embaixador de Portugal. Ele é apenas e só um
dos melhores intérpretes que o futebol conheceu. E ele é nosso.
Orgulhem-se.
Até sempre, Rei.
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