domingo, 16 de março de 2014

Obrigado, Eusébio




Escrever sobre Eusébio já é difícil. Foi um genial jogador e uma pessoa íntegra, humilde e genuína. Escrever sobre o “Pantera Negra” no dia em que partiu é tão complicado como ingrato. É que Eusébio é vida, não é morte. Eusébio é garra, é vitalidade, é força, é toque mágico. Nada em Eusébio combina com o sentimento de tristeza e pesar que invade este país que ama o futebol. Eusébio chorou por nós no Mundial de 1966, ele amava Portugal, ele sentia o nosso país, quis levar a nossa bandeira tão longe quanto possível. As lágrimas dele naquele dia não deviam ser as nossas hoje. Repito: não deviam ser as nossas hoje porque devemos celebrar tudo o que nos deu. Mas nós, ao contrário de Eusébio, somos mortais, choramos a partida dos nossos ídolos, sentimos que mais uma referência desaparece deste Mundo que nos dizem que é apenas uma passagem. De uma coisa estou certo: o King tem lugar onde só os melhores chegam. Uma espécie de paraíso dos geniais, das figuras que lembramos a sorrir, que recordamos pelas melhores razões, numa memória colectiva que jamais se apagará.

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Com Eusébio percebi que o futebol é mais do que um toque fantástico numa bola (que até começou por ser de trapos, no seu caso). Ser futebolista (como desportista em geral) é ter noção de que há um adepto, de que há um valor que mais alto se levanta, há um clube, há um país. Eusébio seguiu a máxima de Mário Wilson que um dia, numa gala de um qualquer aniversário do Sport Lisboa e Benfica, disse que, quando jogava, um valor mais alto se levantava. Esse valor chamava-se Benfica. Eusébio desde cedo percebeu isso e foi enorme. Enorme como poucos serão. Enorme na humildade, na sinceridade, na genuinidade, no respeito pelos companheiros de equipa com mais idade e experiência, e no respeito cheio de rivalidade para com os seus adversários que hoje também o choram. E sem nunca esquecer o adepto, o benfiquista e o português. Ele jogou por todos nós.


Eusébio viveu num tempo difícil, num Portugal cinzento, cheio de incertezas. Ele foi a imagem de um país. Com a “Gaivota” da Amália Rodrigues voou por esses relvados fora sabendo de antemão que o regime queria que fosse a nossa bandeira tentando mostrar que havia um bom ambiente colonial. Eusébio foi também usado politicamente como tantos e tantos outros, Amália, por exemplo. E como gostavam um do outro. Sem rivalidades. Um fintando adversários criando oportunidades de golo onde muitos nem sequer sonhavam que a bola passasse, rematando brilhantemente provocando reacções de espanto nos guarda-redes que nem sabiam por onde a bola tinha entrado. E outro, neste caso outra, cantando e encantando com a ajuda de grandes letras, de grandes composições e de uma voz ainda hoje considerada como uma das melhores vozes do século XX. Eusébio e Amália, duas lendas que se tivessem nascido noutro país, mais aberto ao mundo, eram ainda hoje mais glorificados, mais homenageados, mais profundamente admirados. Têm a admiração deste povo que “Lava no Rio“ e que como dizia Manuel Alegre viu os golos de um senhor que escrevia poesia nos relvados. Hoje, se o mundo dos imortais for como eu sonho estarão juntos a contar histórias e a encantar outros tantos que também merecem lugar cativo nesse espaço belo que a imaginação consegue idealizar. Eusébio vai estar sempre connosco. Ele não é Benfica, é Portugal. Ele não é só jogador, foi um brilhante embaixador de Portugal. Ele é apenas e só um dos melhores intérpretes que o futebol conheceu. E ele é nosso. Orgulhem-se.
Até sempre, Rei.




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